segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A Eucaristia, mistério da Fé (2)

Em termos académicos, poderemos dizer que de uma cena do quotidiano – uma Ceia de despedida – se criou um mistério e uma fé, que são, com a ressurreição, os grandes pilares da Fé cristã. Os princípios donde se parte são os da mitificação do Jesus-homem, principal protagonista da cena, no Messias, no Filho de Deus consubstancial ao Pai, cujas palavras – certamente pronunciadas em sentido metafórico – “Tomai e comei, isto é o meu corpo... Tomai e bebei, isto é o cálice do meu sangue...” foram divinizadas, enchendo-as de simbolismo, de um Cristo real que ali estaria presente sempre que alguém, em seu nome, pronunciasse as palavras mágicas; mágicas porque, por magia, fariam, pelos séculos dos séculos, realmente presente no pão e no vinho, o corpo e o sangue do mesmo Jesus, agora, já transformado em Cristo. E, como tal, foram proclamadas, primeiro por Paulo, uns vinte anos mais tarde após o acontecimento, depois, pelos evangelistas, distantes já uns 40 a 60 anos. O “Fazei isto em memória de mim”, com que Jesus encerra a “cerimónia” já terá sentido real: “Sempre que vos reunirdes para comer, lembrai-vos de mim! De mim, como vosso companheiro, de mim pregador do Reino dos Céus e da fraternidade universal.” Apenas isto – o que qualquer um de nós diria em semelhante transe – e mais nada! Mas vamos aos documentos onde a Igreja se fundamenta para continuar a fazer crer aos fiéis que, após a cerimónia da missa em que o padre profere sobre o pão e sobre o vinho as mágicas palavras, aquele pão e aquele vinho se transformam no corpo real e no sangue real de Cristo, não sendo mais pão, não sendo mais vinho, como o catecismo continua a afirmar e a ensinar às crianças. Mistério, claro! Por ordem cronológica – pela datação mais comummente aceite (datação que apresentaremos em próximo texto) – o primeiro a pronunciar-se sobre tal foi Paulo, na sua carta aos Coríntios (1Cor 11,23-25 e 26-34). Vale a pena transcrever os dizeres de Paulo: “De facto, eu recebi pessoalmente do Senhor aquilo que vos transmiti. Isto é, que o Senhor Jesus, na noite em que foi entregue, tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e disse: «Isto é o meu corpo que será entregue por vós; fazei isto em memória de mim». Do mesmo modo, depois da Ceia, tomou também o cálice, dizendo: «Este cálice é a Nova Aliança no meu sangue; todas as vezes que beberdes dele, fazei-o em memória de mim». Portanto, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha. Por isso, todo aquele que comer do pão ou beber do cálice do Senhor indignamente, será réu do corpo e do sangue do Senhor. Portanto, cada um examine-se a si mesmo antes de comer deste pão e beber deste cálice, pois aquele que come e bebe sem discernir o Corpo come e bebe a própria condenação. É por isso que entre vós há tantos fracos e enfermos e muitos morreram. Se nos examinássemos a nós mesmos, não seríamos julgados; mas o Senhor corrige-nos por meio dos seus julgamentos, para que não sejamos condenados com o mundo. Em resumo, irmãos, quando vos reunirdes para a Ceia, esperai uns pelos outros. Se alguém tem fome coma em sua casa. Assim, não vos reunireis para a vossa própria condenação». As palavras de Paulo merecem um contundente comentário. Fá-lo-emos no próximo texto.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A Eucaristia, mistério da Fé (1)

Em complemento do que dissemos anteriormente, em vários textos, sobre este “mistério”, proponhamos aos teólogos da Eucaristia uma humorística história, sem de forma alguma pretender amesquinhar a fé dos crentes nestes “divinos” mistérios, fé que nos merece todo o respeito. Imaginemos que um sacerdote, numa festa de amigos, em adega aldeã, tabuleiro de pão sobre a mesa, para acompanhar acepipes vários, tonel de vinho à discrição, a dado momento, já talvez bem bebido, se lembra de usar o seu poder de fazer descer Jesus do Céu à Terra, ali, comungando com os amigos alegrias de vida. E, pedindo silêncio, pegando no pão, partindo-o, oferecendo-o, na imitação perfeita de Jesus Cristo, na última ceia, diz as sagradas palavras: “Tomai e comei! Isto é o meu corpo que vai ser entregue por vós”. De igual modo, impondo as mãos sobre o tonel de vinho: “Tomai e bebei. Este é o tonel do meu sangue que será derramado por vós e por muitos para remissão dos pecados. Fazei isto em memória de mim.” A pergunta é óbvia: “Desceu ou não Jesus Cristo àquele pão e àquele vinho? Poderia ou não dizer aos amigos, oferecendo, qual hóstia na missa: O corpo de Cristo ou qual cálice: O sangue de Cristo? Ou teria que o sacerdote estar revestido das vestes eclesiásticas? Ou, pelo facto de o lugar não ser apropriado – uma igreja ou capela ou qualquer cenário criado para o efeito celebrativo, como faz o papa em altares improvisados em campos de futebol – o padre ter perdido os seus poderes de consagrar? A Igreja, no seu Direito Canónico, deve ter-se esquecido de esmiuçar, qual advogado que tem de prever todas as circunstâncias atenuantes ou incriminantes, as condições exactas em que tal poder poderia ser exercido. Assim, caricaturando, até em qualquer jantar um sacerdote, obviamente já não muito sóbrio, poderá “brincar” com o divino. E isto sem qualquer pena eclesiástica ou celestial... Seria interessante ouvir respostas dos exegetas católicos sobre este possível acontecimento (certamente já tendo tido lugar inúmeras vezes por esse mundo católico fora). O resto, remetemos para os textos já aqui anteriormente publicados. Não há dúvida: a Eucaristia, como mistério da Fé, não passa mesmo disso: “mistério” (a razão não entende...) e “de Fé” (está para além da razão), duas premissas juntas que revelam quanto de insensato e de caricato há nesta invenção da Igreja, a partir da descrição da última Ceia relatada nos evangelhos, mas já do conhecimento de Paulo em 1Cor 11,23-25, conhecimento obtido junto de algum discípulo que nela participara. Então, que cada um, cada fiel, retire as suas conclusões e continue a acreditar no que lhe der mais jeito para ter uma vida o mais feliz possível. No fim de contas, é só isso que importa. O resto... Mas, por ser um mistério central da vivência católica, voltaremos ao assunto, referindo as fontes do NT que dão testemunho da eucaristia.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

“Quem foi (é) Jesus Cristo?” – 6

Cristo ressuscitado, que realidade teria? Já nos debruçámos aqui sobre a “verdade”-base do cristianismo – a ressurreição de Jesus – mas vale a pena voltar ao assunto, pela sua magna importância. Lá dizia Paulo: “Se ele não ressuscitou, é vã a nossa Fé”. Afinal, que corpo tinha o Jesus ressuscitado, logo mitificado em Cristo? As várias narrativas dos evangelhos – que, como atrás dissemos, não só não são coincidentes como são contraditórias, sobretudo nas personagens envolvidas – apresentam-nos um ressuscitado como se fora fantasma: caminha ao lado dos discípulos de Emaús, fala com eles e eles só o reconhecem quando desaparece da sua vista; aparece aos apóstolos estando eles trancados no cenáculo, com Tomé ausente, passando, portanto, pelas paredes, come com eles e aqueles só o reconhecem no partir do pão, evaporando-se de seguida; aparece-lhes ainda quando já estava Tomé, de igual modo, e convida Tomé a meter a mão no seu lado do peito ferido pela lança do soldado romano, depois o dedo nos buracos dos pés e das mãos feitos pelos cravos com que fora pregado (pregos talvez inventados, pois o costume era atarem os condenados e não os pregarem aos madeiros), rematando: “Não sejas incrédulo mas fiel! Tu acreditaste, Tomé, porque viste e sentiste; benditos aqueles que, não vendo, acreditarem.” Será verdadeira esta frase? Agora, saltam as perguntas: “Com que boca falava e com que língua articulava as palavras? Com que dentes mastigava e que aparelho digestivo recebia a comida deglutida? Se era um corpo glorioso – ou de outra dimensão, como alguns iluminados dizem – como exercia funções próprias de um corpo de carne e osso? Se entrava e saía com portas e janelas trancadas, qual a sua realidade: real ou virtual? Puramente fantasma? Que corpo foi aquele que Tomé sentiu, metendo a mão na ferida do peito e os dedos nos buracos de pés e mãos? Ferida e buracos ainda sangrando ou já cicatrizados?” Aliás, a mesma incongruência ou a mesma realidade-fantasma acontece com a sua aparição a Maria Madalena, logo ali ao lado do sepulcro, bem como às outras mulheres. Então, facilmente concluímos que palavras que disse, alimentos que comeu, gestos que fez tudo não passou de imaginação dos que estavam presentes, de algum modo alienados por alguma razão desconhecida da História. Mas que tudo o que é narrado como tendo acontecido não aconteceu mesmo, disso não podem restar dúvidas, sobretudo para quem gosta de pensar e de analisar as questões de facto, todos os que – sem ofensa para os crentes! – primam pela honestidade intelectual nesta análise. Valerá a pena tirar conclusões? Valerá a pena dizer que Paulo, se assumisse esta honestidade intelectual, teria sido levado a desmantelar toda a sua cristologia, ficando sem argumentos perante as comunidades que havia fundado baseadas na fé de um Cristo ressuscitado? O que é certo é que esta “Verdade-fantasma” propagou-se de tal modo que hoje aí a temos, viva numa Igreja que pura e simplesmente rejeita qualquer discussão acerca do assunto, colmatando qualquer abordagem com uma afirmação também fantasma: “Cristo ressuscitou e não se fala mais nisso! Verdade inquestionável!...”

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

“Quem foi (é) Jesus Cristo?” – 5

A propósito de um comentário meu, em outras escritas sobre estes assuntos, fui intimado do seguinte modo: Comentário: «O cristianismo (como, aliás, todas as religiões!) é baseado em efabulações: "Alguns discípulos disseram que Ele estava vivo!" (Tomé, claro, que não!) E é a partir desta suposta visão, mais tarde também supostamente tida por Paulo, que Jesus é mitificado em Cristo e que se dá origem ao cristianismo. Depois, a ordem foi "Não questionar!" Cristo tinha ressuscitado e "não se fala mais nisso"! Primeiro, ressurreição carnal, admitida pelos teólogos até ao séc. XX; agora, apenas espiritual, tornando-se a outra impossível, mas continuando consagrada no Credo católico: "Creio na ressurreição da carne!" Intimação: «Francisco Domingues, a você, como a tantos outros, dá-lhe jeito colocar o cristianismo no mesmo saco das outras religiões fundamentadas em mitologias fantasiosas. E isto revela preguiça intelectual da sua parte, porque se estudar a SÉRIO o princípio do cristianismo, verá o quanto estão erradas as suas teorias. Explique aqui à tribuna, como se transformam onze discípulos medrosos em destemidos homens prontos a dar a própria vida pela novidade que proclamam! A ressurreição só pode ser entendida como ressurreição FÍSICA, com um NOVO corpo, ou seja, incorruptível e para uma OUTRA dimensão da existência. É este facto ocorrido há dois milénios a grande coluna que sustém o cristianismo poderosamente. Um conselho: estude a sério as EVIDÊNCIAS históricas do FACTO.» E ainda: «O sr. Francisco deve ler mais cristologia, para não dizer tanto disparate ao mesmo tempo, e aproveite para ler a Bíblia de Jerusalém, com as suas notas. E deixe de auto-promoção porque não lhe fica bem com esse blog.» Claro que respondi com a sapiência possível: Li várias vezes e releio a Bíblia para da Verdade me inteirar. O que é certo é que quanto mais leio mais convencido fico do que venho afirmando e defendendo. Não é pelo facto de uns quantos – poucos! – discípulos terem dado a vida pela Verdade de que estavam convencidos, a começar pelo mestre Jesus, que essa Verdade se torna Verdade! A mensagem de fraternidade universal de Jesus era fantástica, a promessa num Céu para toda a eternidade junto de Deus, fantástica também, e também fantástico o Juízo final para finalmente se fazer justiça. Mas nem Jesus provou o que afirmou nem a morte de uns quantos por essa causa prova seja o que for. Não se imolam por razões menos nobres – até pérfidas! – muçulmanos, gentes que têm a mesma origem semita dos judeus? Aliás, havia muitos interesses político-religosos em causa, naquele tempo, para que tais mortes ocorressem sem serem um enorme acto de heroísmo. Eles acreditavam, como o Mestre, que o fim dos tempos estava próximo (“Em verdade em verdade vos digo que não passará esta geração sem que tudo isto aconteça!”) e que, morrendo, mais depressa ressuscitariam e iriam para o Céu de todas as delícias (Vejam Macabeus). O próprio Jesus deve ter aceitado a morte – de que facilmente se poderia ter livrado, inteligente como era – devido a esta visão do mundo e da vida, acreditando também ser um Messias não de um reino que libertasse os judeus do jugo romano (o que consideraria impossível!), mas de um reino de paz e justiça sobre a Terra a que chamou "Reino de Deus". Também já dissemos, fundamentadamente, que as narrativas das vidas dos discípulos de Jesus que disseram que, depois de morto, o viram vivo e que morreram por defender tal causa, não merecem grande credibilidade. O autor dos relatos das vidas dos apóstolos, nos Actos dos Apóstolos, não merece credibilidade, pois foi capaz de dar por histórico, no seu evangelho, todas aquelas idílicas peripécias que envolveram o nascimento de Jesus (obviamente falsas e copiadas das lendas dos deuses solares antigos). Não sabemos se conheceu os apóstolos (ele era discípulo e médico de Paulo) e escreve cerca de 50 anos depois da morte de Jesus e, certamente, depois da morte de muitos deles. Acresce dizer que de todo o NT não temos originais, apenas cópias do séc. IV, com tudo o que isso implica de possibilidade de fraudes (emendas e acrescentos, conforme os interesses, neste caso, dos bispos de Roma, suportados por Constantino). Diz-se, por exemplo, que Pedro foi bispo de Roma, quando nem se sabe se ele lá esteve. Pelo contrário: Paulo na sua carta aos romanos, na suposta data em que Pedro lá se encontrava, não refere o seu nome. Estranho! A Bíblia não é livro histórico nem palavra de Deus e as testemunhas de Jeová "dão a sua vida" para pregarem tal pelas ruas das cidades. Paulo, o maior estratega da estruturação e divulgação do cristianismo nascente, não é dado como mártir. É lenda a vinda de S. Tiago a Compostela e veja-se o culto que lhe foi (é) prestado. O cristianismo gerou os maiores cismas (católicos, ortodoxos, protestantes) e as mais numerosas seitas e controvérsias. A história dos papas e o primado de Roma estão, desde os primórdios, cheios de fraudes, escândalos e de lutas pelo poder e hegemonia. Gostava de repetir que o que me move aqui é tão só a procura da Verdade e a resposta para o Desconhecido da Vida. Construir e não destruir ou destruir para reconstruir! É tempo de a Igreja aceitar que não tem razão e que prega efabulações e não Verdades de salvação eterna. Deus, na sua sabedoria infinita, nunca poderia ter-se revelado num Jesus judeu, numa época tão conturbada, e deixando tudo tão cheio de mistério numa questão fundamental para a Vida do Homem: o seu post-mortem! Revelar-se-ia, por exemplo, hoje, ou tê-lo-ia feito há 40 ou 50 mil anos, aquando do aparecimento do sapiens sapiens, o nosso inteligente antepassado. Porque o não fez? A não-resposta a esta pergunta arrasa qualquer teoria religosa, a começar pela cristã. Bem como todas as hipóteses de ressurreição sobre a qual já aqui falámos. Basta dizer que as ressurreições narradas nos evangelhos (Lázaro, etc.) não o foram, assim como não se levantaram dos túmulos os mortos e passearam pela cidade (Ver Mateus), aquando da morte de Jesus e, obviamente, a de Jesus também não aconteceu. A ressurreição física, de certeza! A espiritual, com um outro corpo para outra dimensão, cada um pode acreditar no que quiser. Não pode é provar absolutamente nada... E, na procura da Verdade da Vida e do Além, baseando-me na razão – a prerrogativa mais nobre do Homem e tão maltratada pelos pregadores da Fé e de efabulações, dizendo-as Verdades absolutas (e, para tal, inventando que foram reveladas por Deus aos Homens!) – propus uma Nova Religião, aglutinadora de todo o Bom que as existentes (mas incredíveis na sua essência!) contêm, com o Deus da Harmonia Universal, Deus onde tudo se integra, nós também, obviamente, no antes, no durante e no depois da existência de cada um, de cada ser vivo e até do não-vivo. Quem ficar curioso, embora, mais tarde, eu venha a falar disso aqui, veja o cap. final do meu livro "Um Mundo Liderado por Mulheres", Esfera do Caos, ed. (Perdoem-me a publicidade...)