quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (54/?)

 
 
PARA ALÉM DO FIM
Cinco momentos de reflexão
V
Fundamento das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta "Vida de Cristo" narrada pelo próprio.
 
AS ORIGENS DO CRISTIANISMO (2/2)
Análise crítica
De tudo o que se referiu – números 1 a 8 – as dúvidas acerca da factualidade apresentada são mais que muitas. Já provámos, em outros textos e nos itens anteriores, que os evangelhos não nos merecem qualquer credibilidade histórica. 
Repetimos a razão fundamental: terem sido escritos com o simples e único intuito de firmar na Fé em Jesus Cristo, Filho de Deus, as comunidades que iam nascendo aqui e acolá. Por isso, os evangelistas inventaram tudo o que lhes parecia corroborar tal intuito, sobretudo milagres que fossem a prova de que Jesus era Deus ou Filho de Deus encarnado no homem sobre o qual falavam.
Outros argumentos a favor da não credibilidade histórica dos evangelhos merecem ser relembrados, mas serão de menor importância: 1 – terem sido escritos 40 a 70 anos após os acontecimentos referidos; 2 – não ter chegado até nós nenhum original mas apenas cópias dos sécs. III e IV, portanto sujeitos a toda a espécie de corrupção; 3 – não haver nenhuma referência, nos historiadores da época, sobretudo Flávio Josefo e Fílon de Alexandria, aos factos que são narrados nos evangelhos como acontecidos; é que são “factos” tão fora das leis normais que regem a actividade humana que, se tivessem sido verdadeiros, teria sido completamente impossível que não tivessem dado brado por todo império romano, chegando, obviamente, ao conhecimento daqueles historiadores. Aliás, a própria História do mundo de então teria sido completamente diferente: não haveria perseguições mas uma conversão universal… 4 – A imagem que os evangelhos dão de Jesus é completamente antagónica aos objectivos que o próprio Jesus se propunha: pregar a todas as gentes a Boa Nova do Reino de Deus. Então ele não sabia que era vencendo a morte perante todo o Império Romano, ressuscitando e mostrando-se a toda a gente, a começar pelos que o tinham condenado, que convenceria e converteria todos os Homens do mundo conhecido de então e, por arrastamento, todas as gerações vindouras e todas as gentes ainda desconhecidas? (Noutra análise crítica, este será, porventura, o maior argumento contra a veracidade da ressurreição de Jesus e contra o seu carácter de divino ou filho de Deus.)
Mas basta de aduções. E repetimos o que já em outros textos dissemos: o cristianismo nasceu como uma seita judaica que teve como mentor Paulo, o qual, tendo conhecido Jesus através dos discípulos, o elegeu como protótipo de um guru capaz de encabeçar uma nova religião de que ele seria o grande pregador, ultrapassando largamente, pela sua inteligência e conhecimentos – e até influência política – a pregação daqueles discípulos.
O resto da verdadeira história do cristianismo não passa de uma história, história que, no entanto, se avolumou ao longo dos séculos, por múltiplas razões, se desmembrou, guerreando-se as suas facções, sobretudo católicos e protestantes (veja-se ainda a actual Irlanda do Norte!), e atingiu a bonita soma de cerca de dois mil milhões que dizem acreditar no tal Jesus Cristo, Filho de Deus, fazedor de milagres.
E foram os papas e os padres, pelos mais diversos interesses, normalmente de poder sobre as consciências, mas também – ou sobretudo? – pela sede de poder político e económico, que alimentaram toda a aquela história, história arquitectada a partir de uma efabulação, uma falsidade, um engodo para enganar o Homem, toda a humanidade que, por ignorância ou falta de espírito crítico, se vai deixando embalar em crendices que fazem bem à alma e alimentam o sonho de um Paraíso eterno após a morte!
Só resta dizer que, no séc. VII, apareceu o grande rival do Cristianismo: o Maometismo. (O Judaísmo , a outra religião monoteísta, tinha-se ficado pelo Estado de Israel ou espalhou-se pelo mundo, não ultrapassando actualmente os 20 milhões, mas tendo dado à humanidade os maiores cérebros conhecidos, quer para o bem quer para o mal…) Este não se impôs pela mensagem de fraternidade universal, como, no geral, o Cristianismo, mas pela espada: “Ou te convertes ou morrres”! Mas também o Maometismo, que conta com mais de mil milhões de seguidores, se dividiu em seitas que perduram activas e ferozmente antagónicas, obviamente pela sede de domínio – poder político e económico! – de uma sobre a outra. Falamos das duas principais seitas: a dos sunitas e a dos xiitas cujos seguidores, todos os dias cometem atentados uns contra os outros, sobretudo em terras onde, há dois mil anos, imperava o incipiente cristianismo com a sua mensagem de paz e fraternidade: o Iraque, a Síria, o Irão e alguns dos seus vizinhos. Claro que, embora imitem o seu guru, Maomé, chefe guerreiro toda a vida, além de ter escrito o Corão com a ajuda do dinheiro da sua mulher Cadidja, todos esquecem os cinco pilares do Islão: 1 – Afirmar que só Alá é Deus e Maomé o seu profeta; 2 – Rezar cinco vezes ao dia, prostrados por terra e virados para Meca (Que rezarão eles? Planearão mais um ataque bombista, suicida ou não, invocando a protecção de Alá, para que matem, em tal acto, o maior número de inocentes possível?!!!) 3 – Dar esmola 4 - Observar o Ramadão (jejuar faz bem ao corpo e purifica o espírito!) 5 – Ir, se possível, ao menos uma vez, na vida, a Meca! (fazer o quê, santo Deus, santo Alá?!!!)
Ah, perante tais realidades, a vontade que se tem é de desabafar, perguntando:
 “NÃO SERIA O MUNDO MUITO MELHOR SEM A PRAGA DAS RELIGIÕES?”
 E isto, sem menosprezar o grande impacto que a religião, em geral, tem de benéfico sobre as consciências, sobretudo em momentos de grandes frustrações ou perdas, momentos em que só a Fé pode dar algum conforto, alguma serenidade, alguma força para a aceitação do sofrimento. Nem se devem esquecer as muitas organizações que, com base nas igrejas, se dedicam a ajudar os mais carenciados da sociedade. Louvor, pois, a quem dedica parte da sua vida ou a sua vida inteira a tais actividades, estas, sim, bem de acordo com a pregação da fraternidade universal de Jesus Cristo!
Mas, dada a complexidade do ser humano, também poderíamos perguntar se tais movimentos de solidariedade não apareceriam numa sociedade sem qualquer religião. Não surgem, por toda a parte, movimentos de ajuda humanitária quando em alguma parte do Globo, a catástrofe acontece, não se ouvindo falar que estejam conectados com qualquer religião??
 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (53/?)

 
 
PARA ALÉM DO FIM
Cinco momentos de reflexão
V
Fundamento das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta "Vida de Cristo" narrada pelo próprio.
 
AS ORIGENS DO CRISTIANISMO (1/2)
As origens do cristianismo, tal como nos chegaram, após dois mil anos de História,  e tal como nos continuam a ser pregadas pelas igrejas cristãs, mormente a católica, toda a gente as conhece, cristãos e não cristãos, tendo por base os evangelhos e, em geral, o Novo Testamento. Simples e em resumo:
1 – Pelo ano 750 ab urbe condita (da fundação de Roma), apareceu um Jesus, nascido numa província de Israel, a Galileia, filho de Maria e de José, o carpinteiro, da linhagem de David (que havia sido rei dos judeus pelo ano 900 a.C.)
2 – Aos 30 anos, começou a pregar um reino novo, um reino que não era deste mundo, o Reino de Deus, pregando a fraternidade universal e o amor entre os Homens, sendo todos filhos de Deus, portanto, todos irmãos, acompanhando tal mensagem, segundo o relato dos evangelhos, sobretudo o de Mateus, de muitos milagres. Muitíssimos milagres: cegos de nascença que começavam a ver, coxos que andavam, paralíticos que ficavam curados, água que se transformava em vinho, pães e peixes que se multiplicavam, muito para além da necessidade dos famintos que rodeavam Jesus, pois num deles, segundo o mesmo Mateus, cresceram vários cestos, apesar de, à partida, haver apenas meia dúzia de pães e meia dúzia de peixes… E muitos outros!
3 – Prometeu o Paraíso aos pobres, fracos, humildes e aos que fossem tementes a Deus e o Inferno aos ricos e maus.
4 – Escolheu doze discípulos e foi seguido por multidões.
5 – Disse ao discípulo Pedro: “Tu és Pedro e sobre esta pedra eu edificarei a minha Igreja.”
6 – Perguntando aos discípulos: “ E vós, quem dizeis que eu sou?” Responderam eles: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo:”
7 – Insurgiu-se contra os poderes religiosos instituídos que, artificiosamente, o acusaram de se revoltar contra o poder de Roma, embora Jesus tenha dito, quando interrogado sobre o assunto – sabiamente! – “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.
8 - Foi condenado, num julgamento em que inexplicavelmente não se quis defender – o que não teria sido muito difícil, sendo ele quem era (era?!) – morto e sepultado e ressuscitou três dias depois, subindo ao Céu após ter aparecido a alguns discípulos, primeiro a Madalena e aos discípulos de Emaús, depois, a todos os doze, dizendo-lhes “Ide por todo o mundo, pregai a Boa Nova do Reino de Deus a toda a criatura!”.
FIM DA PERSONAGEM apresentada nos quatro evangelhos: os sinópticos de Marcos, Mateus e Lucas e o de João, mais teológico e menos factual.
INÍCIO DO CRISTIANISMO, palavra derivada do cognome atribuído a Jesus, passando-se, após a sua morte, a chamar Jesus Cristo.
9 – Apesar da morte inglória de Jesus e das ameaças dos poderes político-religiosos do tempo, os discípulos continuaram a pregar as ideias do “Mestre”, começando a fundar pequenas comunidades religiosas, mais ou menos clandestinas, com medo de perseguições, partilhando o pão em evocação da última ceia de Jesus com os discípulos. A eles juntou-se uma figura carismática e decisiva na fundação do cristianismo: o gentio Paulo que, de perseguidor se torna pregador fanático, reinventando muitos dos ensinamentos de Jesus.
10 – Muitas comunidades, aliciadas pela mensagem - fraternidade universal, igualdade entre os Homens (todos irmãos porque todos filhos do mesmo Deus), um Paraíso para os bons e um Inferno para os maus - nasceram por todo o Império romano, espalhando-se do Norte de África até aos confins da Ásia Menor e até ao coração do Império: Roma.
11 – Apesar de perseguidas por todos os imperadores, proliferaram. E eram já muitos milhares, de tal modo que o imperador Constantino, com o intuito de unificar o Império, resolveu, em vez de perseguir os cristãos, promover o cristianismo a religião do mesmo Império e, para tal, convocou um Concílio, o de Niceia, em 325.
12 – Aqui, começa a verdadeira saga da expansão do cristianismo, com a preponderância do bispo de Roma a quem começaram a chamar “papa”, havendo logo, cerca de num século mais tarde, os primeiros dissidentes que não aceitavam a autoridade de Roma, elegendo o seu próprio papa que pontificava em Constantinopla, actual Istambul, na Turquia, chamando-se de ortodoxos. A outra grande divisão aconteceria no séc. XVI com Martinho Lutero e o seu Protestantismo, protestantismo que deu origem a numerosas seitas que hoje florescem um pouco por todo o mundo cristão. E as três igrejas continuam a pregar o mesmo Cristo ressuscitado, um Cristo Filho único de Deus, e a sua mensagem de salvação eterna (no Céu), mais do que a da fraternidade universal (na Terra).
 

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (52/?)



 


PARA ALÉM DO FIM

Cinco momentos de reflexão

IV

Fundamento das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta "Vida de Cristo" narrada pelo próprio.

 

 A alma humana não pode ser imortal nem... eterna

Razões lógicas, ontológicas e históricas (também muito sinteticamente: são incontáveis as páginas que filósofos de todos os tempos dedicaram à alma humana, tentando encontrar-lhe o âmago e a essência sem jamais o conseguir, vindo as religiões a apropriarem-se de algumas dessas ideias e a defenderem a sua imortalidade com a consequente eternidade.)

1 – Lógicas:

    Qualquer ser provido de alma – definindo-se alma como “O sopro vital”, pertencente ao reino do invisível, do espiritual e que, por isso, não se sente, não se vê, não se apalpa, mas apenas se percebe pelos seus efeitos, quer intelectuais, quer emocionais, distinguindo-se ainda a racional da animal e da vegetal – adquiriu essa alma no acto de nascer ou de ser concebido. Logicamente, esse ser possui um “sopro vital” aparecido num dado momento do tempo. E é indubitável que o facto de começar um dia tem acoplado a si, impreterivelmente, inexoravelmente, o reverso: acabar num outro dia mais distante. Se quisermos, ao acto de nascer está indelevelmente ligado o acto de morrer. Pensar eterno um ser começado no tempo, seria admitir o impossível: uma meia eternidade, o que forçosamente se perderá nas fronteiras do mito e da fantasia...

2 – Ontológicas:

    O “sopro vital de um ser” só existe enquanto é suporte do mesmo ser que o contém. Quando este deixa de existir, o sopro desaparece com o mesmo encantamento como apareceu no acto de ser. Seria absurdo que subsistisse para além dele! Ou, dito de outro modo: um corpo vivo que morre arrasta forçosamente consigo o sopro vital que o animava: a alma. Mesmo que se considere espiritual! Mesmo que se saiba que o cérebro – todo ele matéria a ter de estar em pleno desempenho para que a alma “funcione” – produza ideias, emoções, sentimentos que nos aparecem revestidos de imaterialidade!

3 – Históricas:

    Quando falamos em “as almas dos antepassados, as almas dos nossos entes queridos, as almas do outro mundo”, etc., etc., sentimo-las como que realidades bem distintas, bem vivas e, por isso, realmente existentes, independentes dos corpos que as sustiveram, vivendo algures no etéreo, na fantasia, no pensamento individual ou colectivo, figurando-se-nos, com facilidade, aqueles corpos. Mas essas almas não passam disso mesmo: figurações, fantasias, evocações, memórias que existirão apenas enquanto perdurarem na mente de alguém. Depois, esfumar-se-ão, desaparecerão inexoravelmente no... nada, como aconteceu com as almas dos muitos biliões de seres inteligentes que já viveram a sua saga de vida na Terra, desde que o Homem é Homem, dos milhões que diariamente vão desaparecendo. Então, se nada delas resta e apenas permanece a recordação de algumas delas na memória individual ou colectiva – e apenas por um pouco de tempo – será totalmente insensato decidirmo-nos pela imortalidade e consequente eternidade da alma humana.

    (No entanto, permitindo-nos voar um pouco nas asas da filosofia, temos forçosamente de nos embrenhar na controvérsia de saber se aquilo a que chamamos alma é ou não a expressão do nosso cérebro, repositório de todas as prerrogativas atribuídas à alma, questionando, portanto, a sua imaterialidade. Afinal, o que é a alma humana? – Quer no sentido clássico, quer no religioso, a alma humana é, além do “sopro vital” comum a todos os seres vivos – a anima dos latinos –, a “entidade” que se manifesta na inteligência e capacidade de raciocinar, nas emoções, no carácter, na capacidade percepcional da informação que os sentidos lhe fornecem, na capacidade de querer e de decidir, na consciência de cada um, havendo, desde a antiguidade, a discussão em torno de saber se ela é autónoma e subsiste por si – a psyké dos gregos. Mas basta ler os estudos dos neurologistas – citemos, por exemplo, Damásio nos seus livros “O Erro de Descartes” e “O Sentimento de Si” – para nos apercebermos de que todas as componentes atribuídas à alma estão no cérebro e que, quando qualquer função do cérebro é afectada por trauma ou doenças, lá se vão as respectivas prerrogativas da alma... A dicotomia alma-corpo torna-se mais evidente na morte: corpo sem vida para um lado, a alma para outro. Ou morreu com o corpo que a sustinha, deixando de “soprar” vida, de manifestar-se em vida no corpo com o qual foi una e indivisível? Como sopro vital, ninguém duvida de que deixou de vivificar o corpo; mas sempre dependeu, mesmo na sua essência, do bom funcionamento dele: “Que me importa o mundo se a digestão me pesa?” Inteligência e emoções, o carácter, a vontade ou o livre arbítrio, as capacidades de perceber e de decidir e até a consciência de si podem soçobrar perante um abuso gastronómico! Quando alguém sofreu morte cerebral – situação diferente da do estado de coma ou da de vida puramente vegetativa – perdeu todas as capacidades que se manifestam com e pela alma: tem activas simplesmente as funções vegetativas se se mantiver ligado a um ventilador que respire por ele. Afinal há um corpo que funciona sem... alma! No entanto, estes estados de “quase” morte ainda apaixonam muitos estudiosos, curiosos por saber o que se passará nesse tremendo limiar em que todos os seres vivos um dia forçosamente se encontrarão. A clássica dicotomia corpo-alma, tanto do agrado dos muitos que, ao longo já de milénios, se dedicaram ao estudo da alma: Platão, Aristóteles, S.to Agostinho, S. Tomás de Aquino, Descartes – para citar apenas os mais importantes – sendo esta a forma daquele, torna-se difícil de explicar à luz da Ciência actual; realmente, cada um tem o corpo e a alma que a genética lhe deu; os genes determinaram um e outro no acto primordial da vida do novo ser. Ao humano juntou-se-lhe a racionalidade que teve o condão de refinar a expressão das emoções e do carácter, suplantando todos os outros animais. Parece que só na memória o elefante lhe levará vantagem, não falando, claro, no campo sensorial!... Comparando tal dicotomia com a realidade, lembra-nos o caracol que não vive sem a sua carapaça nem esta interessa sem que aquele exista e se movimente dentro dela e com ela. Sendo assim, a “forma” – a alma – só é possível visualizar-se, activar-se, ou seja, existir e subsistir, através de e com o seu suporte – o corpo.)


sábado, 9 de novembro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (51/?)


PARA ALÉM DO FIM
Cinco momentos de reflexão
II
Fundamento das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta "Vida de Cristo" narrada pelo próprio.
3 – Defesa de uma tese:
“O Deus das religiões conhecidas não pode existir!”
Razões históricas, ontológicas, racionais, individuais e psicológicas (em síntese):
    1 – Históricas:
    O Homem (o hominídeo cuja consciência de si mesmo desconhecemos completamente) existe há cerca de 7 milhões de anos e o homo sapiens sapiens (de que o Homem actual é o descendente directo) há cerca de 40 mil; as religiões monoteístas existem apenas há cerca de 4 mil anos, (c. 3 mil para os judeus, c. 2 mil para os cristãos, c. 1380 para os muçulmanos) portanto, sem qualquer relevância, importância ou impacto – o mesmo é dizer veracidade! – no tempo. Então, ironicamente, poder-se-ia perguntar: “Acaso andou Deus distraído, esquecendo-se dos Homens que nasceram, viveram, morreram e se condenaram durante 6,996 milhões de anos, ou, digamos para o sapiens sapiens, 36 a 38 mil anos, para só agora vir salvá-los, oferecendo-lhes o Paraíso, se cumprissem os seus mandamentos?” Seria de uma injustiça abissal e, claro, impróprio de um Deus cujos atributos de perfeito, eterno, infinito, omnisciente, todo-poderoso não o permitiriam. Este é um facto que, a não ter resposta, arrasa qualquer argumentação teológica acerca da divindade de Jesus Cristo! Se Deus, na sua infinita inteligência, quisesse revelar-se aos Homens, com uma mensagem de salvação eterna, nunca o teria feito a um judeu, numa região tão conturbada do Globo, naqueles tempos, nestes tempos..., mas tê-lo-ia feito hoje, na era das comunicações rápidas a nível global, fazendo o seu representante – qualquer que ele fosse – tantos milagres quantos os necessários até convencer toda a humanidade da Verdade da Vida e da Salvação!... Então a conclusão é óbvia: nada do que as religiões nos disseram ou nos dizem acerca do seu Deus, mormente a religião cristã, é verdadeiro.
    2 – Ontológicas:
    O ser Deus é simultaneamente de grande e obscura complexidade ou de clara simplicidade. Ou existe como ser independente da matéria, fora do criado e do possível, fora do existente, i. é., fora do Universo visível e invisível – o que se torna incompreensível dada a sua própria natureza de infinito e eterno – ou é Ele próprio – muito mais lógico – todo o existente, todo o possível, toda a realidade em que nos inserimos, embora como seres ontologicamente diferenciados, mas todos fazendo parte dessa mesma realidade. Assim, nós seremos partículas do Deus sempre vivente, infinito e eterno porque se é infinito contém tudo e, se é eterno, nunca poderá deixar de ser e de conter tudo em qualquer momento do tempo. Conclui-se, deste modo, que o Deus das religiões é, ontologicamente, de existência impossível. Conclui-se também que Deus, a existir, será forçosamente um Deus no mais puro conceito de um panteísmo universal: tudo é Deus!
    3 – Racionais:
    Deduzem-se das duas anteriores: se, racionalmente falando, pela sua própria definição de infinito e eterno, não pode haver um Deus independente do tempo e do espaço, nem de tudo o que pertence ao tempo ou existe no espaço, também não pode esse Deus, a um dado momento de tempo – há apenas 2 a 4 mil anos! – ter-se “lembrado” que havia um ser inteligente a quem chamamos Homem e que “precisava” que Ele interviesse na sua História para o salvar e redimir dos seus desmandos e pecados. Isto é não só um absurdo mas um verdadeiro atentado à inteligência de qualquer ser humano! Não podemos, pois, aceitar nenhuma das teorias dos mentores religiosos ou aceitar como válida nenhuma religião existente.
4 – Existenciais:
    Consciente ou inconscientemente, todo o Homem anda à procura da Verdade. Todo o Homem gostaria de saber o que, para além de ter tido o privilégio da Vida – privilégio negado aos incontáveis que ficaram, ficam e ficarão para sempre na hipótese de ser! – o que faz aqui, donde realmente vem e para onde realmente vai: se se perde no Nada e regressa ao Nada de onde veio, se há vida que lhe seja possível para além da morte. Esta é uma procura que lhe dá direito a tudo questionar já que não há nenhuma religião ou filosofia que satisfaça a sua sede de compreensão da Realidade que faz parte da sua própria natureza de ser racional e inteligente. Mitos ou fantasias em que se baseiam todas as religiões, para quê e a quem servirão?
    5 – Psicológicas (the last but not the least!):
    Há duas verdades que explicam as valências do paranormal e do sobrenatural que inundaram as civilizações antigas e pontificam nas actuais. Primeira: o Homem não aceita de boa mente ser ser racional e acabar-se com a morte como qualquer ser vivo à face da Terra; daí o seu desejo de vida eterna a colmatar do modo menos irracional possível, não tendo tido até agora outra alternativa a não ser a da fé. Segunda: o Homem desconhecia e, apesar da avassaladora evolução da Ciência, ainda desconhece uma infinidade de coisas acerca de si próprio e acerca da realidade que o rodeia, desde o átomo à composição e limites do Universo, não sabendo se este é infinito e eterno, passando por todas as forças vivas da Natureza onde se insere, olhando o firmamento belo sim mas cheio de mistérios. Então, para explicar as dúvidas que sempre o atormentaram e continuam a atormentar, resolveu-se pela existência de, primeiro, deuses e, depois, mais recentemente, de um deus único pela impossibilidade ontológica da existência daqueles. Invenções ou efabulações, obviamente! E, obviamente, sem qualquer credibilidade!»
    Nota:
    Embora inter-relacionadas, importa não confrontar estas – elaboradas especificamente para contestar a existência do Deus apresentado pelas religiões monoteístas actuais – com as discutíveis provas da existência de um Deus universal e Criador que foram aparecendo ao longo da História teológico-filosófica, desde Platão a Descartes nos seus “Princípios de Filosofia”, passando por S. Tomás de Aquino na sua “Suma Teológica”, provas de cariz lógico-dedutivo, partindo do movimento ou da causalidade, ou da contingência dos seres, ou dos graus de perfeição, ou do governo do mundo e do Universo, para chegar à necessidade de um Ser Superior Infinito e Eterno..., parecendo, no entanto, esquecer-se a incontornável verdade de que, se é infinito e eterno, tem de ser Ele a Causa e o efeito, o Perfeito e o imperfeito, o Motor e o movimento...

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (50/?)

 
PARA ALÉM DO FIM
Cinco momentos de reflexão
II
Fundamento das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta "Vida de Cristo" narrada pelo próprio.

 Momentos significativos da História

    O Novo Testamento, documento em que a Igreja Católica e as igrejas cristãs se baseiam para apregoar o seu Jesus Cristo, enferma dos mesmos handicaps de muitos dos documentos antigos que chegaram até nós: conseguimos datá-los aproximadamente mas deles apenas temos cópias tardias cuja fidelidade ao original facilmente se pode pôr em causa. Quanto ao N.T., o caso é mais sério porque se trata de textos que visavam implementar uma nova religião que nascera como mais uma seita no seio do fértil berço judaico propenso, naquele tempo, a tais invenções. Diz Cullmann, no seu livro Formação do Novo Testamento: “Não temos nenhum documento original do Novo Testamento, mas cópias. Os manuscritos completos mais antigos que possuímos remontam ao séc. IV. Deixando à parte alguns fragmentos, são cerca de 300 anos que separam a redacção original do texto conservado. Tal espaço de tempo poderia fazer-nos duvidar da autenticidade estrita desses textos. De facto, de cópia em cópia, lograram introduzir-se deformações e impor erros.” Aliás, dentro do próprio cristianismo, nasceram muitas igrejas, contando-se, no tempo de Constantino (séc. IV), entre outras, a grega, a de Antioquia, a de Alexandria, a de Éfeso, a copta, a gnóstica, todas divergindo da de Roma onde o bispo, já se apelidando de papa e com o apoio do imperador, tentava impor a sua hegemonia. Genericamente, o grupo galileu foi um movimento dentro do judaísmo que visava passar a mensagem de uma relação mais espiritualizada entre o Homem e Deus, defendendo também o fim dos tempos e a vinda de um Reino de Deus, Reino de justiça, paz e a fraternidade entre todos os Homens, já que eram todos filhos de Deus.

    Pretendendo estabelecer uma datação dos escritos do N.T., teríamos por ordem de antiguidade, segundo os estudos mais recentes:

1 – Cartas de Paulo (década de 50). Só lhe interessa a figura de Cristo como divino, nada de humano sendo mencionado. 2 – Cartas de Pedro e de Tiago (década de 60). É o mesmo Cristo divino que é apregoado. 3 – Cartas de João, Judas (na mesma senda das anteriores) e o Apocalipse (que deve ser contemporâneo da destruição do Templo em 70). 4 – Carta aos Hebreus, de autor desconhecido. Já são apresentados alguns dados da figura humana de Jesus, considerando-se, por isso, uma transição para os escritos evangélicos. Certamente escrita antes de 70 pois não referencia a destruição do Templo. 5 – Evangelho de Marcos, década de 70. O seu Pequeno Apocalipse terá influências do momento: guerra judaica (66-70), destruição do Templo, incêndio de Jerusalém em 70. 6 – Evangelho de Mateus, década de 80. Copia e aumenta Marcos, com elementos inventados ou retirados da transmissão oral. 7 – Evangelho de Lucas, década de 90. Tendo também Marcos como fonte original, é sinóptico com Mateus, explanando pormenores nos domínios da infância de Jesus e da vida de Maria. 8 – Actos dos Apóstolos do mesmo Lucas, década de 90. Dedicado às actividades sobretudo de Pedro (até ao cap. XIII), depois de Paulo; este não é considerado apóstolo como Paulo se considerava a si mesmo nas cartas, cerca de 30 anos antes, mas rabino fiel à lei mosaica. 9 – Evangelho de João, pelo ano 100. Demarca-se dos três primeiros pela sua cristologia: Jesus Cristo é o Filho de Deus feito homem e veio como Logos para revelar o Pai.

    É interessante notar que os primeiros padres, como Clemente de Roma, Inácio, Policarpo, que escreveram entre 90 e 130, não se referem nem às cartas nem aos evangelhos, certamente por desconhecimento: aqueles documentos circulariam apenas dentro das comunidades para as quais eram escritos, não sendo portanto partilhados com outras.

    Muitos outros textos sobre Jesus apareceram, mas de menor qualidade tanto literária como doutrinal. São os apócrifos – séc.s II e III – que foram sempre rejeitados pelo cânone dos livros aceites pela Igreja como de inspiração divina. Entre eles, destaca-se o Evangelho de Tomé cujo texto foi descoberto em 1945, em Nag Hammadi, Egipto, e que, segundo alguns estudiosos, será anterior aos evangelhos sinópticos, tendo-se estes inspirado nele. A sua leitura sugere-nos uma colectânea de aforismos ou sentenças, máximas atribuídas ao Mestre Jesus e expressas em trocadilhos cheios de significado uns, inócuos ou incompreensíveis outros, alguns rondando o nonsense: “Toda a mulher que se fizer homem entrará no Reino dos Céus.”

    O estabelecimento do cânone dos livros ditos inspirados por Deus não foi nem fácil nem pacífico. Pelo contrário. Sobretudo no que se refere ao N.T. Do A.T., já havia o cânone judaico estabelecido no séc. I a.C. e a Igreja limitou-se a acrescentar mais sete que lhe “pareceram” merecer tal estatuto. Estão neste rol os citados Livros da Sabedoria e de Daniel. Havia também a Versão dos Setenta ou Septuaginta, do séc. III a.C., tradução para grego do A.T. atribuída a setenta sábios iluminados da comunidade judaica de Alexandria. O cânone oficial dos 27 livros do N.T. só foi estabelecido em 397, no Concílio de Cartago, tendo sido muito mais tarde, no Concílio de Trento (1545-1563), definitivamente aceite pela Igreja Católica a versão da Vulgata de S. Jerónimo (347-420), padre que traduziu para latim, do grego o N.T. e do hebraico o A.T. Antes da Vulgata, e contemporaneamente, havia inúmeras traduções, variedade de que se queixava S.to Agostinho (354-430), e que chegaram até nós em documentos dos sécs. IV, V e VI, constituindo o que se designava de Vetus Latina. A primeira luta oficial pela separação entre Evangelhos apócrifos e canónicos deu-se no Concílio de Niceia, 325, contando-se a propósito as mais bizarras histórias. O Concílio de Niceia foi o primeiro concílio ecuménico e um dos mais importantes para a Igreja Católica. Convocado pelo imperador Constantino, com o fim de unificar a Igreja cuja religião queria impor a todo o império, nele participaram mais de 300 bispos. Três magnas questões ocuparam os participantes: a consubstancialidade de Jesus Cristo com Deus, como Filho, a existência do Espírito Santo e a consequente Santíssima Trindade. Os muitos bispos que não apoiaram nem concordaram com tais “divinas” inspirações, negando pura e simplesmente a divindade de Jesus, como os arianos, foram expulsos, excomungados, perseguidos e exilados. É neste concílio que é fundada oficialmente a Igreja Católica, com a sua doutrina teológica que perdura no Credo niceno, pouco já guardando da mensagem do Jesus dos Evangelhos, podendo dizer-se com alguma ironia que Constantino foi o seu primeiro Papa. A guerra trinitária, no entanto, continuou e só se impôs definitivamente, em 381, no concílio de Constantinopla convocado pelo imperador Teodósio, tendo, mais uma vez, os contestatários sido excomungados e perseguidos.

    Que conclusão poderemos tirar deste curtíssimo mas significativo acervo histórico? – Novamente que toda a documentação em que a Igreja se baseia para impor o seu Cristo tem uma base histórica extremamente frágil, quer ao nível da existência de um duvidoso Jesus, quer ao nível do Cristo divino, ou do Jesus mitificado em Cristo, nitidamente fruto da fantasia dos actores dos primórdios do cristianismo, constituindo-se o grupo galileu como uma seita religiosa dentro do judaísmo. O movimento cristão, mais tarde com a igreja de Roma à cabeça, iria ter um sucesso retumbante graças aos ventos favoráveis do poder político em que se apoiou, pontificando Constantino, tendo-se este servido do cristianismo para unificar o Império... Outra conclusão interessantíssima é que o Jesus histórico, não passando o nível do humano, embora com carisma especial, só pretendeu dar uma pedrada no charco da hipocrisia em que viviam as classes religiosas do tempo, pregando um Reino de paz e de justiça, um Reino de fraternidade universal, sendo ricos e pobres todos igualmente Filhos de Deus... mas sem qualquer intuito de formar uma religião e – muito menos! – de se arrogar o título exclusivo de “Filho único” desse mesmo Deus.